Como já dito no post
anterior, na Santa Casa de São Paulo está sendo disponibilizado,
além do acompanhamento dermatológico, o oftalmológico.
O médico
oftalmologista responsável por esse atendimento, Dr. Ronaldo Sano,
está também realizando estudos sobre a visão em pessoas albinas no
Instituto de
Psicologia (IP) da Universidade de São Paulo (USP).
O Instituto
de Psicologia da USP possui um “Laboratório da Visão”. Pois
é... Existe uma área da psicologia chamada “psicofísica”,
segundo a qual a percepção que os indivíduos têm do mundo
exterior por meio da visão tem uma dimensão psicológica.
Este
laboratório possui alguns equipamentos exclusivos para se realizar a
avaliação da percepção de cores e de contraste pelas pessoas. E é
aí que está a importância dos testes para nós albinos.
Por
que realizar teste de percepção de cores por albinos?
Muitos
estudos sugerem que albinos apresentam daltonismo ou visão limitada
de cores. Acredita-se nisso porque a maioria de nós albinos não
apresenta uma região central da retina chamada mácula. (Em pessoas
normalmente pigmentadas, nessa região da retina, a mácula, há
maior concentração de receptores de estímulos visuais denominados
cones, os quais são responsáveis pela visão de cores).
A
ideia do Dr. Ronaldo é aplicar o teste de percepção de cores em pessoas albinas para verificar se de fato existe a tal limitação
sugerida pelos estudos científicos.
Por
enquanto poucos albinos se submeteram ao teste, mas, dos avaliados,
todos apresentaram visão normal para cores, o que parece, portanto,
apontar para o fato de que a teoria está equivocada a esse respeito.
E
quanto ao teste de percepção de contraste?
Imagina-se
que os albinos têm uma visão reduzida de contraste em razão da
excessiva entrada de luz em seus olhos, por causa de um problema
chamado “transiluminação da íris”.
A
íris (parte colorida do olho) em pessoas normalmente pigmentadas
possui melanina, que impede a entrada de luz por ela, protegendo a
retina dos raios UV solares e impedindo uma excessiva luminosidade
dentro do olho, que atrapalharia uma boa projeção da imagem na
retina.
Em
pessoas sem problemas de pigmentação a entrada de luz no olho
ocorre apenas pela pupila e o próprio organismo ajusta o tamanho da
pupila, dilatando-a ou comprimindo-a conforme a luminosidade do
ambiente.
Em
albinos, entretanto, que apresentam pouca pigmentação (pouca
melanina) na iris tal proteção e controle são reduzidos, de modo
que acabam passando raios de luz pela íris.
Uma
das consequências disso é a fotofobia, ou seja, o desconforto em
ambientes muito iluminados, que a maioria de nós albinos sente.
Mas
outra consequência é que este excesso de entrada de luz no olho
atrapalha a formação da imagem na retina. E um dos principais
problemas está na percepção de contraste.
Pretende-se
com o teste não apenas confirmar que essa limitação de fato
acontece e está relacionada à “transiluminação da íris”,
como também quantificar isso, ou seja, avaliar quanto da limitação
da percepção de contraste é efeito direto do excesso de entrada de
luz no olho dos albinos.
Para
poder fazer essa avaliação foram desenvolvidas lentes de contato
filtrantes, que são lentes de contato mais escuras na região da
íris (tom castanho), que impedem a entrada de luz. Ou seja: tais
lentes fazem o papel que faria uma íris normalmente pigmentada,
impedindo a entrada de luz no olho por outro lugar que não a pupila.
Primeiramente
é realizado o teste de percepção de contraste sem as lentes e
verifica-se (ou, pelo menos até o momento em todos os albinos
examinados se verificou) que há de fato uma visão limitada de
contraste por pessoas albinas.
Depois
o mesmo teste é realizado novamente com o albino usando as tais
lentes filtrantes e se percebe que há alguma melhora na
visão de contraste. O grau dessa melhora ainda não foi
quantificado, pois os dados da pesquisa ainda estão sendo levantados
cada vez que um novo albino é avaliado.
Somente
após um número significativo de albinos ter sido avaliado se poderá
compilar os dados e compará-los com os resultados apresentados por
pessoas normalmente pigmentadas para quantificar o quanto a visão de
contrastes pelos albinos está reduzida e o quanto ela pode ser
melhorada pelo uso dessas lentes de contato filtrantes.
Rick
e eu estivemos ontem nesse Laboratório da Visão, acompanhados pelo
Dr. Ronaldo, e passamos por todos aqueles testes. Os nossos resultados
foram de que possuíamos visão normal para cores, mas limitada para
contraste.
Experimentamos
as lentes de contato filtrantes e percebemos que houve alguma redução
em nossa fotofobia e uma sutil melhora na definição das imagens
vistas de perto, embora as vistas de longe ficassem levemente
embaçadas. E, segundo o oftalmologista, nossa visão de contraste
também se apresentou um pouco melhorada no teste feito com as
lentes.
O
Dr. Ronaldo explicou que esse problema de enxergar os objetos
distantes um pouco embaçados devia-se ao fato de que as lentes
usadas no teste têm um tamanho “genérico” e que, na verdade,
cada pessoa precisa de uma lente feita sob medida, conforme a
curvatura de seu olho.
Eu,
particularmente, achei as lentes um pouco incômodas por serem
acrílicas e não gelatinosas. Por causa do movimento dos olhos
causado pelo nistagmo, sentia a lente se movimentando também,
causando um leve atrito. Enfim, não gostei muito. Assim como não
gostei do fato de as lentes terem nos deixado de olhos castanhos!
(Sim, os olhos ficam escuros, pois a parte da lente que faz as vezes
da íris é meio marrom).
De
qualquer forma, entendo que essa lente é só um protótipo que está
sendo testado, que provavelmente será aprimorada depois e que há
chances de que venha a ser mais um auxílio óptico para nós
albinos.
Embora
a lente não vá resolver todos os nossos problemas visuais, ela
poderá reduzi-los um pouquinho, pois, além de controlar a entrada
de luminosidade nos olhos, segundo o Dr. Ronaldo, nelas também
poderá ser colocado grau para resolver problemas como miopia,
hipermetropia e astigmatismo. Ou seja: nos livramos da fotofobia e
dos óculos ao mesmo tempo!
Daí
só vai faltar resolver o “problema” de deixar nossos olhos
castanhos, rs.
Enfim,
mais uma vez recomendamos a todos que participem desses testes. Além
de ser algo muito interessante, é muito importante para nós
albinos, uma vez que de todos esses estudos certamente resultarão
políticas públicas e recursos ópticos que trarão melhorias às
nossas vidas.