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Foto para reportagem da Veja - 2006

30/10/2012

SOMOS “PESSOAS COM DEFICIÊNCIA”

Palavras deveriam ser só palavras. Mas não. Elas carregam emoções, estigmas, preconceitos. Palavras ganham vida e diferentes sentidos conforme o contexto em que são utilizadas e a entonação com que são proferidas.
Sempre considerei a busca pelo termo “políticamente correto” uma forma invertida de preconceito. Buscar um eufemismo para suavizar uma condição me pareceu sempre uma forma implícita de assumir que a condição precisava ser suavizada. E, se uma condição precisava ter sua definição de alguma forma suavizada é porque havia algo de “pesado” intrínseco a ela.
Entretanto, eu pertenço a um grupo específico de pessoas que possui uma característica genética específica para o qual a discussão do termo adequado para definição de nossa condição é bastante recorrente.
Meu organismo tem a sintetização da melanina, substância que dá cor ao cabelo, aos pelos, à pele, à íris e à retina, comprometida devido a um defeito em um gene. Desta forma, meu organismo produz quantidade de melanina bem inferior ao que deveria produzir, de modo que meus cabelos, pêlos, pele, íris e retina são bem mais claros do que o normal. Esta condição é denominada albinismo.
Mas é sempre difícil explicar o albinismo. Quando fui escrever a respeito dele neste blog, me deparei com a dúvida de que termo usar para completar a frase “albinismo é”... É o que? É uma condição genética? É um distúrbio? É um problema?
Muitos se referem a ele como uma doença. Mas este termo me soa pesado e, mais que isso, inadequado mesmo. Doença remete, pelo menos na minha visão, à ideia de dor e sofrimento e à necessidade do uso de medicação, coisa que não é o nosso caso.
Para o albinismo não existe remédio nem preventivo e nem paleativo. O albinismo não causa dor ou sofrimentio físico.
O que ele causa é uma maior sensibiklidade à exposição aos raios solares, aumentando drasticamente o risco de desenvolvimento de queimaduras e tumores de pele. Neste sentido, o albinismo não é uma doença em si, e sim uma herança genética que acaba aumentando a predisposição da pessoa ao desenvolvimento de uma doença chamada cãncer de pele. Então, creio eu, o mais adequado seria dizer que o albinismo é um problema metabólico (problema na sintetização pelo organismo de uma proteína denominada melanina) que decorre de um defeito genético.
Esta produção reduzida de melanina afeta também, como já mencionei, a adequada pigmentação da íris e da retina dos indivíduos com albinismo, fazendo com que a maioria deles tenham sérios problemas de visão, que em geral resultam em uma baixa visão, também chamada da visão subnormal, já que a acuidade visual fica bastante inferior à das pessoas em geral.
Assim sendo, quem apresenta albinismo costuma apresentar algum grau de deficiência visual. E aqui novamente nos deparamos com a dificuldade para estabelecer um termo a ser usado que defina esta condição que seja claro sem reforçar qualquer preconceito ou induzir a qualquer ofensa...
Pelo que andei lendo, até o começo do século 20, pessoas que apresentassem qualquer característica em alguma medida limitante eram denominadas inválidas, o que é terrível, já que esta palavra imediatamente traz consigo a ideia de que aquela pessoa não é de nenhuma maneira produtiva e útil para a sociedade.
Depois mudou-se o termo para “indivíduos com capacidade residual”, o que já significou uma melhora, já que pelo menos admitia-se que alguma capacidade existia.
Entre as décadas de 60 e 80 começou-se a utilizar os termos “deficientes” e “excepcionais”, o que representou outra melhora, mas continuou acenruando a ideia da diferença, fazendo a visão da limitação prevalecer sobre a visão da pessoa.
Daí, ao longo da década de 80, por conta dos movimentos na sociedade civil, a Organização Mundial da Saúde lançou a terminologia “pessoas deficientes”.
Podem parecer simples palavras, mas a verdade é que a atribuição do valor “pessoas” áqueles que tinham deficiências, muda a visão sobre o indivíduo; tira-se o foco da sua limitação e o volta para o fato de ser também um ser humano como os demais, igualando-o em direitos aos demais membros da sociedade em vez de o segregar
Embora o termo “correto”, segundo a ONU, para se referir a esse grupo específico de pessoas seja “pessoas com deficiência”, ainda vemos por aí muitas outras terminologias sendo utilizadas.
Quem nunca ouviu um “pessoas portadora de necessidades especiais”? Muitos concurseiros certamente que sim, já que em todos editais de concurso se fala a respeito das “vagas para os PNEs”... De onde surgiu isso? De outro documento da ONU, chamado “Declaração de Salamanca”, de 1994, que tratava de stabelecer princípios, políticas e prática para o ensino para “pessoas com necessidades educativas especiais”. Mas seu uso está completamente equivocado, uma vez que aquele documento, ao utilizar o dito termo, o fazia de modo bem mais abrangente, referindo-se tanto a crianças com deficiências físicas e mentais quanto a sobredotados intelectualmente.
Outro termo comumente utilizado e que no Brasil encontra inclusive amparo legal é o de “pessoa portadora de deficiência”. Embora ele ainda seja amplamente utilizado na legislação brasileira, está caindo em desuso, tanto que a CORDE (Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência), ligada ao Governo Federal, recentemente mudou de nome para Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Mas por que aquele termo seria inadequado? Porque uma pessoa não “porta” uma deficiência, assim como não porta qualquer outra característica sua. A deficiência faz parte dela.
Assim sendo, o termo correto para nos definirmos é o “pessoa com deficiência”. E não simplesmente por uma questão de eufemismo, de ser “politicamente correto”, e sim porque parece ser, considerando todos os demais, o mais “auto explicativo” acerca da situação, sem no entanto reforçar a segregação. Somos pessoas como todas as outras, no entanto com uma determinada limitação (no nosso caso visual).
E que o “status” de “pessoa com deficiência” não assuste. A consciência de que se é uma pessoa com deficiência permite o reconhecimento das limitações, o qual faz com que a pessoa busque os meios externos (equipamentos ópticos, por exemplo) para suprir sua capacidade visual deficiente e executar de forma autônoma praticamente a maior parte das tarefas que as pessoas sem graves problemas visuais executam, e a aceitação de algumas impossibilidades (como pode ser dirigir, por exemplo, conforme o grau do problema visual).

29/10/2012

Tipos de Albinismo e Síndromes Associadas


Há muita informação equivocada ou mal explicada na internet associando o albinismo a uma série de síndromes. Por esta razão decidimos fazer esta postagem de esclarecimento.

A ciência identificou até o momento 12 tipos distintos de albinismo. São 12 tipos distintos porque são causados por 12 diferentes mutações genéticas em diferentes genes.
Como já explicado em outras postagens, os tipos mais comuns e mais frequentes de albinismo óculo cutâneo são o Tirosinase Negativo (TIPO 1) e o Tirosinase Positivo (Tipo 2).
Mas há também o registro da existência de albinismo causado por mutações em vários outros genes.
Outras duas formas de albinismo óculo cutâneo são o Tipo 3 e o Tipo 4, que serão objeto de outra postagem específica.
Aqui o que se quer explicar é que esses quatro tipos de albinismo óculo cutâneo, embora provenham de mutações genéticas em genes distintos, são parecidos no sentido de ocasionarem pouca pigmentação nos cabelos, pêlos, pele, íris, retina e os decorrentes problemas visuais.
Além da hipersensibilidade da pele à exposição solar, que torna a pessoa mais susceptível ao câncer de pele, e da visão subnormal, não há outros problemas de saúde relacionados a esses tipos de albinismo.


Genes associados com albinismo em humanos
Gen Fenótipo
Gen tirosinase (TYR) Albinismo oculocutâneo tipo 1 (OCAl)
Gen P Albinismo oculocutâneo tipo 2 (OCA2)
Gen tirosinase, relacionado com a proteina-l (TYRP l) Albinismo oculocutâneo tipo 3 (OCA3)
Gen asociado à proteína transportadora transmembrana (MATP) Albinismo ocuIocutáneo tipo 4 (OCA4)
Gen HPS1 Síndrome Hennansky-Pudlak tipo 1 (HPS1)
Gen β-3 A-adaptina (ADTB3A) Síndrome Hennansky-Pudlak tipo 2 (HPS2)
Gen HPS3 Síndrome Hennansky-Pudlak tipo 3 (HPS3)
Gen HPS4 Síndrome Hennansky-Pudlak tipo 4 (HPS4)
Gen HPS5 Síndrome Hennansky-Pudlak tipo 5 (HPS5)
Gen HPS6 Síndrome Hennansky-Pudlak tipo 6 (HPS6)
Gen CHS1 Síndrome Chediak-Hígashi (CHS)
Gen OA1 Albinismo ocular ligado ao Cr X (OA)

O que ocorre – e que gera toda a confusão – é que existem alguns tipos extremamente raros de albinismo que estão associados a outras doenças, por isso são chamados de Síndromes.
Na verdade, trata-se de um problema genético que gera distúrbios em várias células do indivíduo, ocasionando diversos problemas no metabolismo da pessoa. E o melanócito (célula que produz a melanina, que é a substância que dá cor à pele e ao cabelo) é apenas mais uma das células afetadas. Por isso, o indivíduo que tem o gene com a mutação que gera a tal síndrome apresenta vários distúrbios metabólicos que geram problemas de saúde e um distúrbio na produção de melanina que faz com que ele também seja albino.

Portanto, a informação muitas vezes disseminada na internet de que albinos podem desenvolver determinadas síndromes está equivocada. Os tipos de albinismo mais comuns e frequentes na população não estão associados a quaisquer outros problemas de saúde e estas pessoas não desenvolvem qualquer síndrome em decorrência do albinismo em si.
O que ocorre é que existe um tipo específico de mutação genética MUITO RARO em que a pessoa apresenta diversos problemas metabólicos conjuntamente, sendo a hipopigmentação apenas mais um deles.

Embora sejam distúrbios genéticos bastante raros, a título de curiosidade trataremos deles abaixo:


Síndrome de Hermansky-Pudlak (SHP)

A SHP, por um lado, é muito rara em geral e, por outro, tem maior incidência em pessoas de origem porto-riquenha (1 a cada 8.000 habitantes).Ela pode ocorrer por mutações genéticas em 6 distintos genes. Portanto, existem 6 tipos diferentes de SHP.
Tal síndrome é caracterizada, por um lado, pela pouca pigmentação de pele, cabelos e olhos (como nos outros tipos de albinismo) e, por outro lado, pelo acúmulo anormal de pigmentação em células da medula óssea e de outros tecidos, tais como vasos sanguíneos, capilares, rins e nódulos linfáticos. Tais mutações podem acarretar, além de problemas de hemorragia, problemas nos pulmões que dificultam a respiração) e inflamação intestinal, que pode levar a diarreia hemorrágica.
Portanto, o indivíduo que sofre desta mutação genética, além do albinismo óculo cutâneo, apresenta problemas de coagulação do sangue, que podem gerar hemorragias e dificuldades na cicatrização de ferimentos na pele, podendo ocorrer formações frequentes de hematomas e de sangramentos pelo nariz.


Síndrome de Chediak-Higashi (SCH):

Trata-se de outro problema genético raro. Casos dessa síndrome foram encontrados em Cuba e têm maior incidência em pessoas de origem espanhola, embora possam afetar também indivíduos de outras origens e raças.
Nessa síndrome, além de albinismo óculo cutâneo (baixa pigmentação de pele, cabelo, íris e retina), o indivíduo apresenta diversos problemas, tais como anemia e infecções recorrentes.
Esses problemas são consequentes de anormalidades em células que compõem o sangue do indivíduo. Uma dessas anormalidades é que os leucócitos (células de defesa do organismo) têm uma atividade migratória mais lenta que o normal, ou seja, demoram muito a se deslocar para o local onde há uma bactéria para combatê-la.
Por esta razão, o organismo da pessoa demora muito a se defender de bactérias, o que faz com que o indivíduo tenha problemas de infecção frequentes.
Os afetados geralmente falecem ainda na infância por causa desse problema imunológico do organismo, que não consegue se defender da invasão de bactérias que geram doenças.